Vou contar-vos a minha história.
O meu nome é Ana. Tenho 23 anos, feitos este ano, por alturas do verão. Cresci numa
aldeia (talvez lugar seja a palavra mais correcta) pequena, onde tudo se conta e sabe. A proximidade é tanta que a privacidade é quase nula. Sou a primeira de
dois filhos, e gosto muito que assim seja. Sou uma pessoa simples, livre de vaidades
e isenta de arrogância. Sou eu.
Enquanto crescia, os meus pais e
avós ensinaram-me a respeitar sempre os mais velhos e a proteger sempre os mais
novos. Ensinaram-me a cumprimentar as pessoas quando me cruzo com elas na rua
e, hoje em dia, dou por mim a dizer “boa tarde” a quem não conheço. Ensinaram-me
a diferença entre o bem e o mal. Tentaram tornar-me numa pessoa tolerante e
compreensiva. Repetiram vezes sem conta o famoso ditado “Junta-te aos bons e
serás melhor que eles. Junta-te aos maus e serás pior que eles”, e nunca me
deixaram esquecer que independentemente daquilo que os outros façam ou digam, importa
manter-me fiel a mim mesma. Ensinaram-me a acreditar nas pessoas, mesmo quando
no fundo há qualquer coisa que nos diz que não devemos fazê-lo. Ensinaram-me a
ser sincera, a dizer sempre o que pensava e sentia. Assim fiz e faço, mas
confesso que não tantas vezes como seria desejável. Gosto de pensar que tenho
um saco que enche, e vai enchendo à medida que vou ouvindo o que não gosto, ou
o que não me parece justo, sem proferir uma única palavra de desagrado. Até que
o saco encha e transborde.
Ensinaram-me a não julgar as
pessoas pela roupa que vestem ou pelas coisas que têm, mas sim por aquilo que
são verdadeiramente. Ensinaram-me também a desconfiar dos desconhecidos e a
confiar nos que já conheço. Disseram-me que teria muitos amigos, mas que
provavelmente iria conseguir contar pelos dedos das mãos aqueles que valeriam
realmente a pena. Palavras sábias. Ensinaram-me a preocupar-me com os outros.
Eu levei este ensinamento ao extremo. Gosto de gostar das pessoas, mas tenho
alguma dificuldade em dizê-lo. No entanto, é inegável que me preocupo com elas,
mesmo quando elas não fazem ideia. Sofro, como se na pele deles estivesse.
Vê-los ou ouvi-los aflitos deixa-me pequena e imóvel. Os meus pais e avós
ensinaram-me muita coisa, e é a eles que devo tudo o que sou hoje. Mas há
coisas que só o tempo foi capaz de me ensinar.
Coisas como a desilusão. A
hipocrisia. A fraqueza de espirito e a falta de carácter. A ausência de
valores. O desdém e a má-fé. A cobardia. A revolta. A omissão e a mentira.
Mas mesmo assim, depois de todas
as vezes em que fui obrigada a abrir os olhos por causa do que o tempo me
tentava ensinar, mantive a minha memória curta, como a de um peixe, e acabei
sempre por perdoar (mesmo que nem todos saibam) todos aqueles que me fizeram
mal.
Queria pedir desculpa aos meus
pais e avós por tudo o que me ensinaram e eu não fui capaz de aprender na
altura. Queria agradecer ao tempo por se encarregar disso. Mas pensando bem, o
tempo é apenas o mensageiro de todos aqueles que me desiludiram. Por isso, e
porque os meus pais e avós também me ensinaram a fazê-lo sempre, MUITO OBRIGADA
aos cobardes, hipócritas, omissos e submissos da mentira, por tudo o que me têm
ensinado.
No dia em que os meus olhos se
abrirem, as vossas caras não passarão de meros rostos aleatórios, como aqueles
com quem me cruzo todos os dias.
Para Ouvir: Lily Allen - Fuck You Para Ver: Madagascar 3 (2012)
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